Daniela Vasconcellos Gomes (OAB/RS 58.090)
Um dos pontos de grande discussão com a entrada em vigor da Lei 13.467/2017 que impôs a reforma da CLT é a sua aplicabilidade em relação a questões de direito material, ou seja, se a reforma legislativa retroagiria aos contratos já existentes, ou se seria aplicável somente aos contratos novos.
Existem normas de direito intertemporal para resolver a questão, como o artigo 5º da Constituição, e o artigo 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, que assim dispõem: “Art. 5º/CF. [...] XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada” e “Art. 6º/LINDB. A lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”.
Para melhor entendimento do tema, cabe esclarecer que o ato jurídico perfeito é aquele já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou; o instituto do direito adquirido é um recurso para limitar a retroatividade da lei, pois assegura que os direitos já adquiridos por uma pessoa não podem ser prejudicados por novas leis; e a coisa julgada diz respeito à decisão judicial de que já não caiba recurso.
Assim, pela lei brasileira, fica claro que a lei não poderia retroagir, mas alguns insistiam (e alguns ainda insistem) na retroatividade da lei, e outros que a nova lei somente seria aplicável aos contratos de trabalho iniciados após a entrada em vigor da legislação.
A polêmica ficou ainda pior a partir da metade de abril, pois perdeu eficácia a Medida Provisória 808/2017, que dispunha: “o disposto na Lei 13.467, de 13 de julho de 2017, se aplica, na integralidade, aos contratos de trabalho vigentes”. Assim, com a perda da eficácia da Medida Provisória 808/2017, teria restado uma lacuna normativa sobre a aplicabilidade da lei.
Para esclarecer a questão, podemos elencar três situações distintas em relação à aplicabilidade da reforma da CLT:
Situação 1: Aplicação em relação aos contratos encerrados antes de 11/11/2017: a modificação na lei não permite a aplicação retroativa das novas disposições em relação a atos jurídicos perfeitos, que recebem proteção não apenas da legislação, como da própria Constituição Federal de 1988.
Situação 2: Aplicação em relação aos contratos celebrados a partir de 11/11/2017: quanto a estes, não há qualquer dúvida quanto a aplicação integral da Lei 13.467/2017.
Situação 3: Aplicação em relação aos contratos celebrados antes de 11/11/2017 e que continuam ativos: assim, a maior controvérsia se instaura em relação aos contratos em curso. Já se sabe que não há dúvidas de que os atos jurídicos praticados sob a lei anterior não são alterados pela nova lei, mas as dúvidas surgem em relação aos atos praticados após a data de 11/11/2017 em relação aos contratos anteriores a lei. Nesse caso, o direito adquirido protege os direitos do trabalhador até 10/11/2017, não podendo se projetar para o futuro, pois nesse caso, não há direito adquirido, e sim mera expectativa de direito.
Além disso, é preciso ressaltar que a Lei 13.467/17 não é uma lei superior às demais. Não faz letra morta da Constituição Federal e dos tratados internacionais relativos aos direitos humanos e aos direitos sociais, nem se sobrepõe aos princípios, conceitos e institutos jurídicos do Direito do Trabalho, de modo que muitos juízes trabalhistas já têm demonstrado que não deverão aplicar de forma literal a legislação imposta, como visto no 19º Congresso Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, ocorrido em maio de 2018.
Publicado originalmente em: Jornal Informante (Farroupilha), v. 550, ago. 2018.