A relativização do critério econômico na concessão do benefício assistencial

Mathias Felipe Gewehr (OAB/RS 54.294)

Daniela Vasconcellos Gomes (OAB/RS 58.090)

O benefício de prestação continuada está previsto no inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, que assim dispõe: “a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei”. Trata-se de típico benefício destinado à assistência social e, neste aspecto, não pode ser confundido com benefícios de cunho eminentemente previdenciário, tais como as aposentadorias e pensões.

A concessão do benefício de prestação continuada está legalmente vinculada ao preenchimento de determinados requisitos, tais como a comprovação da deficiência ou da idade mínima de 65 anos para o idoso não deficiente; a renda familiar mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo; não estar vinculado a nenhum regime de previdência social; e não receber benefício de espécie alguma.

No entanto, com relação a referidos requisitos exigidos para a concessão do benefício assistencial ao idoso e ao deficiente, há de se observar que existe no campo doutrinário e jurisprudencial diversas correntes que defendem a relativização do critério da renda per capita como também quanto ao recebimento de outros benefícios pelo grupo familiar.

De modo que importa ressaltar que a percepção dos benefícios sociais legalmente instituídos através de políticas públicas de distribuição de renda e erradicação da pobreza – a exemplo do que ocorre com o bolsa família, vale gás e bolsa escola – não retiram do requerente o direito à percepção do benefício assistencial, vez que todos buscam maior justiça social.

Com relação ao critério econômico, que analisa a renda per capita dos membros do grupo familiar do postulante ao benefício, é de ser esclarecido que o atual posicionamento jurisprudencial caminha no sentido de avaliar outros fatores de ordem pessoal que possibilitem a interpretação extensiva do dispositivo legal que impõe a renda de ¼ do salário mínimo por componente do grupo familiar.

Nesse propósito, aliás, nasceu no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, importante corrente jurisprudencial dentro do direito pátrio que firmou, mediante interpretação extensiva do disposto no § 3º do art. 20 da Lei 8.247/93, modificação substancial, elevando o critério da renda per capita para ½ salário mínimo por membro do grupo familiar, de acordo com os critérios da razoabilidade e da isonomia, vez que presentes na Lei 9.533/97 tal percentual para a caracterização de miserabilidade.

Este entendimento serviu também para que o Superior Tribunal de Justiça também adotasse em sede de julgamento de recursos repetitivos, uma maior elasticidade com relação ao critério da renda per capita, admitindo que a renda superior a ½ salário mínimo por membro do grupo familiar do requerente poderá ser provada por outros meios, sendo que a renda em ¼ por cabeça se presume de modo absoluto e independe de outros critérios probatórios.

Enfrentando a discussão criada com relação ao estabelecimento dos critérios da renda per capita, o Supremo Tribunal Federal manifestou-se no sentido que a verificação de outros critérios para chegar-se ao reconhecimento do direito ao benefício, mesmo para aqueles com renda superior a ¼ não ferem o julgamento da ADI 1.232.

Isso ocorre porque o benefício assistencial visa assegurar uma melhor qualidade de vida a seus beneficiários, de forma a efetivar a dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil, conforme previsto no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988.

 

Publicado originalmente em: Jornal Informante (Farroupilha – RS), v. 315, fev. 2014.

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