A proteção jurídica das diversas formas de família

Daniela Vasconcellos Gomes (OAB/RS 58.090)

Mesmo com as inúmeras transformações sofridas em sua configuração, a família ainda representa uma das estruturas mais importantes da sociedade. Independente de sua forma, os laços que ligam as pessoas em família garantem o suporte e a segurança que tanto precisamos para a vida.

Atualmente, as mais diversas formas de convívio passaram a ser aceitas pela sociedade, e as pessoas podem constituir a família da forma que lhes convier, não estando mais limitadas ao casamento para ser reconhecidas como família.

Afastou-se da idéia de família o pressuposto do casamento, identificando como família também a união estável (art. 226, §3º/CF), as famílias monoparentais, entre outras, como a homoafetiva, anaparental e a pluriparental.

As famílias monoparentais foram elevadas a entidade familiar com a Constituição de 1988, que no artigo 226, §4º/CF elencou como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

A chamada família anaparental é aquela caracterizada pela convivência entre parentes com o mesmo grau de parentesco entre seus membros, ou entre pessoas, ainda que não parentes, por longo tempo, conjugando esforços para a formação de um acervo patrimonial comum e com objetivos de vida comuns, tais como irmãs que vivem juntas, ou primos que decidem residir em outra cidade para tentar uma nova vida, etc.

A família pluriparental ou mosaico é aquela cada vez mais comum nos dias de hoje, pois resulta da pluralidade de relações parentais, especialmente fomentadas pelo divórcio, pela separação, e pelo novo casamento ou pela nova união. Pode-se dizer que é aquela família formada por vários filhos: “os meus”, “os teus”, e “os nossos”.

Sua estrutura é complexa, pois decorre de uma multiplicidade de vínculos, e apresenta ambigüidade das funções dos novos casais e forte grau de interdependência. A administração de interesses visando o equilíbrio assume grande relevo à estabilidade das famílias, mas a lei simplesmente esqueceu-se delas.

A família homoafetiva teve grande dificuldade em ter seu reconhecimento jurídico, mesmo sendo uma realidade social, mas somente em maio de 2011 que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a união estável para casais do mesmo sexo, garantindo direitos há muito reivindicados.

Mas, se o casamento deixa de ser a única forma de constituição de família, o grande desafio dos dias de hoje é descobrir o toque diferenciador das estruturas interpessoais que permita inseri-las em um conceito mais amplo de família.

Assim, na busca do conceito de entidade familiar, é necessário ter uma visão pluralista, que albergue os mais diversos arranjos vivenciais. É preciso achar o elemento que autorize reconhecer a origem do relacionamento das pessoas. Esse ponto de identificação encontra-se no vínculo afetivo.

É o envolvimento emocional que diferencia um relacionamento do âmbito do direito obrigacional – cujo núcleo é a vontade – para introduzi-lo no direito das famílias, cujo elemento estruturante é o sentimento de amor, o elo efetivo que funde as almas e confunde os patrimônios, fazendo gerar responsabilidades e comprometimentos mútuos.

O elemento distintivo da família, que coloca sob o manto da juridicidade, é a presença de um vínculo afetivo a unir as pessoas com identidade de projetos de vida e propósitos comuns, gerando comprometimento mútuo.

Atualmente, para a configuração de família, não há mais sequer a necessidade de existir um casal, pois a família não está mais unicamente ligada a finalidade procriativa. Ou seja, a ligação dos indivíduos que a compõe pode ser biológica ou sócio-psico-afetiva. A família é organização subjetiva fundamental para a construção individual da felicidade. O objetivo passa a ser a solidariedade social e demais condições para aperfeiçoamento e progresso humano.

De modo que a sociedade moderna impõe um modelo familiar descentralizado, democrático, igualitário e desmatrimonializado. A família atual transcende o fenômeno exclusivamente biológico, para buscar uma dimensão mais ampla, fundada na realização pessoal de seus membros, em que a mola propulsora é o afeto.

A entidade familiar, apesar do que muitos dizem, não se mostra em decadência. Ao contrário, é o resultado das transformações sociais. Houve a repersonalização das relações familiares na busca do atendimento aos interesses mais valiosos das pessoas humanas: afeto, solidariedade, lealdade, confiança, respeito e amor.

 

Publicado originalmente em: Jornal Informante (Farroupilha – RS), v. 184, ago. 2011.

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