Entendendo a alienação parental e o dano afetivo

Daniela Vasconcellos Gomes (OAB/RS 58.090)

Entre os temas de direito de família que originam muitas dúvidas atualmente estão a alienação parental e o dano afetivo.

A chamada “síndrome da alienação parental”, ou “implantação de falsas memórias” ocorre quando, após a ruptura da vida conjugal, um dos cônjuges não consegue elaborar adequadamente o luto da separação e o sentimento de rejeição (ou até de traição), fazendo surgir um desejo de vingança, o que desencadeia um processo de destruição, de desmoralização, de descrédito do ex-parceiro.

Ou seja, a síndrome da alienação parental nada mais é que uma “lavagem cerebral” feita por um dos genitores ao filho, narrando maliciosamente fatos que não ocorreram ou que ocorreram de forma diversa daquela descrita pelo alienador.

Muitos podem ser os procedimentos adotados para que ocorra a alienação: impedir visitas do genitor não guardião e dizer ao filho que este não quis vê-lo; destruir cartas, cartões ou presentes enviados pelo genitor ao filho, para que esse se sinta abandonado; induzir a criança a identificar outras pessoas como genitor, que não seu genitor verdadeiro; até a possibilidade de sugerir ter havido abuso sexual.

Assim, a criança ou o adolescente passa aos poucos a se convencer da versão que lhe foi implantada, gerando a nítida sensação de que essas lembranças de fato ocorreram. Isso gera contradição de sentimentos e destruição do vínculo entre genitor e o filho.

O filho é utilizado como instrumento da agressividade: é levado a rejeitar o outro genitor, a odiá-lo. Trata-se de verdadeira campanha de desmoralização. A criança é levada a afastar-se de quem ama e de quem também a ama.

Restando órfão do genitor alienado, o filho acaba se identificando com o genitor alienador, passando a aceitar como verdadeiro tudo o que lhe é informado.

É preciso ter presente que esta também é uma forma de abuso que põe em risco a saúde emocional de uma criança. Ela acaba passando por uma crise, pois a lealdade com um dos pais implica deslealdade com o outro, o que gera um sentimento de culpa quando, na fase adulta, constatar que foi cúmplice de uma grande injustiça. Evidenciada tal postura por parte do genitor guardião, possível a transferência da guarda e até a destituição do poder familiar, que é um direito-dever exercido pelos genitores, mas que serve ao interesse do(s) filho(s).

Outro tema relacionado ao exercício do poder familiar que começa a despertar a atenção é o chamado dano afetivo. Para compreendê-lo, é preciso ter em mente que o poder familiar impõe deveres aos pais, especialmente o de criação e educação dos filhos, para que estes possam desenvolver de forma plena a sua personalidade.

Por isso, hoje já se fala em paternidade responsável, e já se percebe que a convivência dos filhos com os pais não é direito, é dever. Não é direito do genitor de visitar o(s) filho(s), e sim é obrigação de visitá-lo(s). De modo que a falta de convívio dos pais com os filhos pode gerar severas seqüelas psicológicas e comprometer o desenvolvimento saudável da criança ou do adolescente, já que o sentimento de dor e de abandono pode ocasionar danos permanentes aos filhos afetivamente abandonados.

De modo que, com base no princípio constitucional da solidariedade social (art. 3º, I/CF), há a possibilidade de indenização por abandono afetivo, já que ato ilícito é a soma de lesão a direito a um dano causado, e no abandono afetivo há a violação do dever de criação e educação dos filhos e o dano psíquico causado à criança, devendo, assim, o lesante reparar o dano causado.

De onde surge esse dever de indenizar? A lei obriga e responsabiliza os pais no que toca aos cuidados com os filhos. A ausência desses cuidados, o abandono moral, viola a integridade psicofísica dos filhos, bem como o princípio da solidariedade familiar, valores protegidos constitucionalmente. Esse tipo de violação configura dano moral. E quem causa dano é obrigado a indenizar, e a indenização deve ser em valor suficiente para cobrir as despesas necessárias para que o filho possa amenizar as sequelas psicológicas mediante tratamento terapêutico.

Assim, embora os tribunais ainda tratem da matéria de forma extremamente cautelosa, não resta dúvida que a lei obriga e responsabiliza os pais no que diz respeito aos cuidados com os filhos. De modo que a violação ao dever legal de criação e educação dos filhos pode configurar dano moral, e desse modo, deve haver a indenização para que o filho possa amenizar as sequelas psicológicas causadas no seio de sua própria família.

 

Publicado originalmente em: Jornal Informante (Farroupilha – RS), v. 145, nov. 2010.

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